Pouca gente sabe, mas observar a própria língua pode ser um bom medidor de como anda a saúde. Uma língua saudável é rosada, viçosa, brilhante, com bom tônus e saburra (crosta que cobre o fundo da língua) branca, fina e úmida. "Em contrapartida, a presença de tremores, inchaço, marcas de dentes ou cor alterada demonstram um aspecto menos saudável", afirma a homeopata Maisa Misiara.
Alterações na cor e no aspecto do órgão indicam, principalmente, deficiências de vitaminas no corpo, segundo Estelita Betti, otorrinolaringologista do Hospital Albert Einstein. De acordo com ela, uma língua esbranquiçada pode indicar deficiência de ferro ou biotina (vitamina que desempenha papel na manutenção da pele). Já uma língua avermelhada e inchada pode significar falta de vitaminas E, B2 e B3. Carência de vitamina B12 e ácido fólico podem gerar uma sensação de ardor. Neste último caso, é importante descartar a presença de fungos (candidíase oral), que pode gerar os mesmos sintomas.
Porém, mais do que uma simples deficiência nutricional, a falta de vitaminas no organismo pode indicar que há algo mais sério acontecendo. "Pessoas com doença crônica que cause má absorção tendem a ter dificuldade em absorver vitaminas lipossolúveis (A, D e K) e vitamina B12. As doenças do fígado prejudicam o armazenamento de vitamina A e B12 e interferem com o metabolismo de proteínas e glicose. E pessoas com doença renal têm deficiência de proteína, ferro e vitamina D", explica.
Revestimento alterado
Além da cor da língua, observar o aspecto e a saburra pode render subsídios para a descoberta de outros males. "Quando existe uma redução do fluxo salivar, aumento da viscosidade da saliva ou da descamação da língua, estes três fatores, isoladamente ou associados, irão aumentar a saburra lingual", explica Betti.
Algumas doenças sistêmicas podem reduzir a parte líquida da saliva, causando um acúmulo anormal de restos sólidos sobre o órgão. "Isso é comum em pacientes diabéticos ou desidratados", fala Betti. Já pessoas que respiram pela boca, como as que têm rinite e sinusite, podem desenvolver uma maior descamação lingual (veja mais exemplos de alterações no quadro ao fim do texto).
Segundo a otorrinolaringologista, doenças do aparelho gastrointestinal não se refletem na língua, ao contrário do que muitos acreditam. "Não está comprovado que doenças do esôfago e ou do estômago causem saburra lingual", afirma.
Antes de qualquer diagnóstico, que pode ser feito por meio da análise visual ou de exames como a sialometria (análise do volume, viscosidade e densidade da saliva), vale avaliar se a pigmentação da saburra é real ou fruto de algum alimento ingerido recentemente.
De acordo com Ana Kolbe, cirurgiã dentista e presidente da Associação Baiana de Estudos e Pesquisas dos Odores da Boca, fatores emocionais também podem afetar a saburra. "Ela imediatamente se altera em consequência de estresse, ansiedade e traumas. O mesmo acontece pelo uso de medicamentos como antidepressivos", avalia.
Em pacientes estressados, explica Betti, o corpo faz aumentar a produção de mucina, responsável pela viscosidade da saliva e pela aderência de micro-organismos sobre o dorso da língua, fazendo aumentar a saburra.
Prática milenar
A observação da língua como subsídio para a descoberta de doenças não é algo novo. A prática é usada há mais de 5.000 anos pela medicina chinesa. Segundo a antiga sabedoria, o órgão conteria prolongamentos dos meridianos do corpo, permitindo que a energia dos órgãos vitais ficasse visível nela. "Ao observamos a língua de alguém, podemos conhecer seu corpo por inteiro, dos órgãos à sua psique. Cada pedacinho nos conta que algo está acontecendo", explica Misiara.
A LÍNGUA TAMBÉM PODE DIZER UM POUCO SOBRE QUEM VOCÊ É, SEGUNDO A MEDICINA AYURVEDA. VEJA MAIS A SEGUIR:
- A língua pequena, fina, de aparência um pouco seca, áspera e ativa pode demonstrar uma natureza leve. São pessoas criativas, alegres, mas, por outro lado, agitadas, medrosas e ansiosas
- A língua larga em sua base e afilada na ponta pode demonstrar uma natureza emocional clara. São pessoas objetivas, práticas, perfeccionistas, com senso de justiça, mas, por outro lado, indignadas, irritáveis e coléricas
- A língua de formato redonda, grossa, lisa e úmida pode demonstrar uma natureza emocional suave. São pessoas amorosas, que gostam do contato, da vida, mas, por outro lado, podem se apresentar apegados, melancólicos, com propensão a mágoas e ressentimentos
- Fonte: Maisa Misiara, Homeopata
Como a planta dos pés e os olhos, seria uma espécie de "mapa" do corpo humano: a ponta representa a cabeça e o coração; a base, os órgãos pélvicos; o centro, o baço e o estômago; e as laterais, o fígado e os pulmões.
Alterações indicariam desequilíbrios de yin e yang no corpo. "Se está mais para vermelha significa uma predominância de yang. Quando está pálida significa uma predominância de yin. Se a saburra está espessa e pegajosa, significa que os líquidos orgânicos estão mais espessos, uma alteração chamada de fleuma. Se há marcas de dentes significa que há uma deficiência na energia vital", lista o clínico geral Alex Botsaris, especialista em medicina chinesa.
Também para a medicina oriental a língua pode ser afetada por questões emocionais. De acordo com Botsaris, a alteração surge quando algum problema se aprofunda. "Isso significa que precisa ser intensa e persistir por muito tempo para afetar a língua", diz ele.
Segundo Misiara, uma rachadura no meio da língua ou o órgão com aspecto inchado e com marcas de dentes podem indicar que a pessoa anda estressada. "Quando profundo, o sulco significa que a pessoa guarda muitas emoções", relata.
Como não há comprovação científica, ainda há muito ceticismo sobre essas teorias. Alguns profissionais, no entanto, acreditam que a observação da língua pode complementar o diagnóstico da medicina tradicional. "Na minha prática, a medicina chinesa incorpora conceitos que melhoram a avaliação e o resultado dos tratamentos, incluindo o exame da língua", conta Botsaris.
Em qualquer um dos casos citados, é indispensável procurar um médico especialista e não tratar qualquer tipo de doença apenas com base na avaliação da língua. Este tipo de exame é apenas auxiliar e também não deve ser feito em casa, sem orientação.
"O diagnóstico pela língua é complementar e não dispensa uma avaliação geral do paciente", frisa Kolbe. "Devemos somá-lo ao exame geral e buscar outros recursos diagnósticos que confirmem nossa hipótese", pontua Misiara.